A Anestesia No Paciente Com HIV
A Anestesia no paciente com HIV
É estimado que 20 a 25% das pessoas com HIV positivo precisarão de alguma intervenção cirúrgica em algum momento de suas vidas.
Dra. Marília Camelo 15/12/2018
Você sabia?
Até 25% dos portadores de HIV precisarão de intervenção cirúrgica em algum momento da sua vida. Saiba qual o papel do anestesiologista nesse caso.
Desde o primeiro relato de morte devido pneumonia por Pneumocystis carini e a identificação do HIV (Vírus da Imunodeficiência Humana) em 1981, a incidência de infecção por HIV tem crescido para proporções alarmantes. Em uma média global, 40 milhões de pessoas vivem com HIV. É estimado que 20 a 25% das pessoas com HIV positivo precisarão de alguma intervenção cirúrgica em algum momento de suas vidas.
A Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS) é uma condição médica complexa. As anormalidades neurológicas, pulmonares, cardiovasculares e hematológicas são de particular interesse aos anestesiologistas. Desta forma, o conhecimento das implicações clínicas do HIV e AIDS é de suma importância para um adequado planejamento anestésico.
Na fase inicial da infeção pelo HIV foram documentados presença de cefaléia, fotofobia, meningoencefalite, depressão, neuropatias craniais e periféricas. A fase tardia pode ser associada a demência, encefalopatia, mielopatia, miopatia e neuropatia periférica. A incidência de neuropatia periférica é de 35% na fase inicial da infecção[1] e de 55% na fase tardia. A disfunção do sistema autônomo também é relatada na infecção do HIV. Estudos demonstraram a incidência de 15% de disfunção cardíaca por neuropatia autonômica nos pacientes infectados pelo HIV. Derrame pericárdico, miocardite, endocardite, cardiomiopatia dilatada e hipertensão pulmonar também são relatados. A incidência de hipertensão pulmonar é de 1:200 pacientes infectados com o HIV enquanto é de 1:200.000 na população em geral. A terapia antirretroviral proporciona redução da incidência de doença pericárdica, porém com o aumento da doença coronariana devido a dislipidemia associada as medicações antirretrovirais. Adicionalmente, pode ocorrer o envolvimento da medula levando a um quadro de pancitopenia. Problemas de coagulação podem variar do estado de hipercoagulabilidade até sangramento por trombocitopenia. Diversas alterações metabólicas foram relatadas no paciente com HIV, entre elas a hiperglicemia, hipercolesterolemia e diabetes melitus.
Pacientes com infecção pelo HIV podem ser submetidos a intervenção cirúrgica mais comumente para drenagem de abscessos, cesariana, emergências abdominais como sangramento e perfurações, biópsia de linfonodo, esplenectomias, colectomias, ulceração perianal, fístulas e linfomas. Desta forma, a avaliação pré-operatória deve ser cuidadosa, tendo-se especial atenção às condições cardiológicas, pulmonares, neurológicas e metabólicas. Exames laboratoriais gerais devem ser solicitados, além de ECG (ou ecocardiograma a depender do resultado do ECG e condição clínica), raio-X de tórax e contagem de CD4 (preferencialmente contagem > 500/mm3). Foi relatado aumento de infeção pós-operatória em pacientes com contagem < 200/mm3.
Existe pouca informação em relação ao risco da anestesia e cirurgia de pacientes com HIV positivo e nenhuma cirurgia deve ser adiada com base apenas no fato do paciente ser portador do HIV[10]. Desta forma, a classificação do estado físico do ASA é mais importante do que o fato do paciente ser HIV positivo quando considerarmos a possibilidade de complicações perioperatórias.
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